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A flora da Caatinga

Quem não conhece a Caatinga e anda pelas veredas do sertão surpreende-se com paisagens diferentes daquelas vistas em filmes, programas de televisão e livros didáticos. Ao contrário dos estereótipos, a flora da Caatinga é rica, biodiversa e cheia de vida.

Na Caatinga existem aproximadamente 3150 espécies de plantas com flores, destas, cerca de 720 são endêmicas, ou seja, só existem na região, como é o caso da Catingueira (Caesalpinia pyramidalis), do Mandacaru (Cereus jamacaru), do Pau-branco (Auxemma oncocalyx) e da Jurema Preta (Mimosa tenuiflora).

Mas como é possível uma biodiversidade tão alta em uma região que é conhecida pelo estereótipo de escassez de água e infertilidade do solo? Bem, essa é exatamente a mentalidade que precisamos mudar.

A flora da Caatinga não é pobre, ela é apenas diferente. Ao longo de milênios, as plantas do semiárido desenvolveram uma série de estratégias e métodos para conviver com as irregularidades hídricas do bioma, uma vez que as chuvas dessa região ficam concentradas em um período específico do ano. Essas características são chamadas de “xeromorfismo” e são as condições mais marcantes da vegetação da Caatinga.

É, inclusive, por causa do “xeromorfismo” que as árvores da Caatinga perdem as folhas ao fim da época de chuvas. Assim sendo, grande parte vegetação do semiárido ganha aquele aspecto esbranquiçado que traz a sensação de que as plantas estão mortas.

Mas, na verdade, elas estão vivíssimas. As plantas da Caatinga perdem suas cores e deixam suas folhas caírem para evitar a perda de água. Sem as folhas verdes, a taxa fotossintética é drasticamente reduzida e a planta entra em estágio de economia de energia e uso de reservas. Essas plantas são conhecidas como “caducifólias”.

Além da perda de folhas, as árvores da Caatinga desenvolveram outras técnicas de convivência com o semiárido: folhas pequenas ou até mesmo modificadas em espinhos para reduzir a transpiração, cascas grossas, floração reduzida, troncos e raízes com a capacidade de armazenar água e até mesmo folhas cobertas de cera impermeável para dificultar a perda de água, como ocorre com a Carnaúba (Copernicia prunifera).

Muitas plantas também adotam a estratégia de escape ou fuga da escassez de água, acelerando e diminuindo o seu ciclo de vida ou adiando o período de germinação para épocas com maior umidade no solo. Em outras palavras, elas germinam, florescem e morrem ainda no período chuvoso para aproveitar a água disponível no ambiente. Um exemplo são as plantas herbáceas, como o capim.

Dessa forma, é possível perceber que a vegetação da Caatinga passou por milênios de evolução até selecionar características anatômicas (formato) e fisiológicas (funcionamento) perfeitas para a convivência saudável com o semiárido. E embora sejam menos abundantes, também é importante ressaltar que algumas espécies vegetais da Caatinga não perdem as folhas durante a estiagem. É o caso do Juazeiro (Ziziphus joazeiro), do Icó (Capparis yco) e da Oiticica (Licania rigida).

O desmatamento

A irregularidade das chuvas e a escassez de água não são os únicos desafios enfrentados pela vegetação semiárida. O desmatamento é um dos principais problemas que aflige a flora da Caatinga. 

Segundo o Projeto de Mapeamento Anual do Uso e Cobertura da Terra no Brasil (MapBiomas), o desmatamento avança semiárido adentro a galopes. A plataforma, que foi criada em 2015, demonstra que atualmente, por dia, 152,3 hectares de Caatinga são desmatados. Em números comparativos é como se, diariamente, florestas do tamanho de 184 campos de futebol fossem derrubadas.

Apenas entre novembro de 2018 e dezembro de 2021, a equipe do MapBiomas registrou a derrubada de 173.605,8 hectares de floresta da Caatinga, ou seja, 1.736 km². Para exemplificar, a área desmatada equivale algo em torno de cinco vezes o território geográfico da cidade de Fortaleza (CE). Ao total, durante toda a época de monitoramento, a plataforma emitiu 13.938 alertas de desmatamento.

A sensação que fica é que as florestas da Caatinga são destruídas enquanto a sociedade e as autoridades observam, imóveis, o tombar das árvores.

O implacável avanço do desmatamento contra as florestas da Caatinga tem inúmeras consequências: êxodo rural, empobrecimento do solo, redução da biodiversidade, extinção de animais e plantas, aumento da temperatura global, piora na qualidade de vida da população, redução da umidade do ar, aterramento de rios, lagos e riachos e além, é claro, da desertificação.